Precisamos falar sobre Marian - Nº5

Eu não me arrependo de qualquer surto cardíaco que o capítulo anterior possa ter causado. Pelo menos o de hoje é o último - semana que vem será apenas o posfácio.

Capítulo Cinco

Na arquibancada da carreira de tiro, ninguém ousava respirar. Todos os olhares se voltavam para o telhado onde Robin aparecera. Ele tinha o arco retesado, outra flecha pronta.

O toldo que cobria os assentos da nobreza atrapalhava a visão de Marian, e ela já estava a meio caminho de se levantar para conseguir vê-lo melhor quando uma voz interna a censurou.

"Pare com isso, ele é dez anos mais velho."

"Sir Kendrick também é."

"Ele disse que a floresta não é lugar para uma jovem dama."

"Eu não quero ser uma jovem dama! Não se isso significa ficar só assistindo enquanto homens ricos abusam do seu poder!"

"O que adianta o que eu quero, se Robin não me quer?"

Ela não tinha resposta para isso. Suas discussões internas — tão frequentes durante o inverno — geralmente se encerravam aí, a dor de um coração partido dando a palavra final. Mas então...

Meu tio diz que nossa família precisa de uma mulher como Vossa Alteza.

"Ele realmente disse isso? Quer dizer... e se ele só me quiser pelas minhas habilidades de planejamento?"

"É mais do que papai quer."

A voz interna às vezes podia ser cruel. Um grito cortou o silêncio tenso da arena, trazendo-a de volta para a realidade. Sir Kendrick cambaleou, uma flecha em sua coxa.

— Eu disse para não se aproximar do garoto. — A voz de Robin era sombria. Ele prezava tanto pela imagem do "Bando Alegre" que Marian às vezes esquecia que ele também podia soar assim. — Will, pode vir.

O garoto começou a se afastar da arena com dificuldade.

O Duque se levantou, colérico.

— Guardas!

***

— Senhor Dale!

A cantoria de Allan foi interrompida por um garoto de doze ou treze anos que chegava sem fôlego.

— Will está machucado. Ele e o Robin vão ficar cercados!

"Droga!" Sabiam que Will não venceria a competição se algum nobre estivesse competindo, mas não era para ele estar gravemente ferido. Isso tornaria difícil para o rapaz desaparecer com Robin no meio da multidão. Olhou para o garoto que lhe trouxera a informação. Ele era familiar. O filho do moleiro.

— Nick, certo? — O garoto assentiu. — Você sabe conduzir uma carroça?

***

— Senhor Deus seja louvado! Meu bom homem, que bom que você chegou! Eu tenho certeza que a guarda do Duque fará a justiça, em nome do Bom Senhor Jesus!

— Frade, com licença, eu não posso...

O capitão da guarda pessoal do Duque tentava se desvencilhar de frei Tuck. Não conseguia decidir se o religioso estava bêbado. O estalajadeiro responsável pela tenda de bebidas e um coletor de apostas também não estavam ajudando, gritando sobre uma "competição de bebedeira" e "reembolso" e "balbúrdia".

— Pois assim está escrito nos mandamentos! Dai a César o que é de César! O Duque representa as leis desta terra, e a guarda representa as leis do Duque! Eu tenho certeza que, pelas mãos do bom capitão, a Justiça será feita!

Tuck era especialista em sermões. Continuou despejando apelos emocionais, citações semi-esquecidas de escrituras e uma bela dose de ladainha ininteligível, praticamente em modo automático. No seu coração, murmurava uma prece para que a Guarda permanecesse ocupada até que Robin e os meninos conseguissem escapar.

***

A carreira de tiro era puro caos.

— Onde estão esses malditos guardas? Alguém prenda esse homem! — o Duque gritava.

O povo não se movia. Conheciam Robin Hood, ou pelo menos sua fama. Se não o amavam por seu trabalho, certamente o amavam por sua ousadia. Peitar o xerife! Libertar os condenados à morte por não pagar impostos! E agora ele estava lá, diante deles! Ainda assim, ninguém tinha coragem de apoiá-lo abertamente. Ninguém queria se arriscar a ser visado e repreendido pelo Duque.

A nobreza presente não era tão familiar com os feitos de Robin Hood. Nem todos haviam associado baixas repentinas em seus estoques com as atividades do fora da lei, e os que se davam conta não espalhariam a notícia, preferindo manter a própria dignidade a advertir os nobres das terras vizinhas. Estavam acostumados a não fazer nada, e nada faziam.

Robin Hood, o homem do momento, o Príncipe dos Ladrões, olhava para a multidão, procurando desesperadamente por brechas. Will não podia escapar para os telhados naquele estado. Não era pra ser assim. Olhou para Marian do outro lado da arena. Era para terem falado com ela discretamente, nos festejos após o torneio.

Marian também olhava para ele, e seus olhares se cruzaram.

Pela primeira vez, Robin entendeu todo o afeto e desejo de Marian pelo que realmente eram. Ela não era uma donzela indefesa, não era uma criança ingênua que não entendia as consequências de suas ações, não era uma jovem impulsiva agindo em prol de sentimentos passageiros. Ela era uma mulher — uma linda mulher — que demonstrara inúmeras vezes ter coragem e compaixão genuínas. E, por alguma razão, ela o amava. E talvez por finalmente ser vista, Marian conseguiu ver também: não o Robin Hood herói e lenda que idolatrara na infância, mas um homem. Um homem cansado, com medo de que sua família e amigos fossem mortos por culpa dele. Um homem dolorosamente ciente de suas limitações, mas que de alguma forma conseguia manter o bom humor.

Como se ouvisse os pensamentos dela, Robin sorriu e quebrou o contato visual. Marian ainda não enxergava uma saída para a situação, mas decidiu confiar nele. Estava decidida a ajudar Robin Hood e seu bando antes, não estava? Acreditava na missão deles. Acreditava em Robin.

***

— Então, Nick, você tem interesse na vida de fora da lei? — Allan perguntava ao garoto enquanto os dois corriam entre as barracas de atrações do festival.

— Quê?

Antes de responder, Allan o agarrou, forçando-o a fazer uma curva brusca. Homens do xerife, voltando de mãos vazias do estande de tiro, indo na mesma direção que eles. Finalmente, achou o que estava procurando.

— Porque, veja bem, você está prestes a roubar uma carroça.

Meteu seu chapéu emplumado na cabeça do garoto. Limpou a garganta.

— Fogo! Fogo na barraca do cervejeiro! A cerveja e o vinho estão queimando! Fogo!

A performance de Allan chamou a atenção de um motorista de carroça que terminava de descarregar suprimentos em uma barraca. Conforme o trovador se afastava, avisando a todos sobre o suposto incêndio, homens começaram a se mobilizar para levar baldes d'água até o local afetado. O motorista da carroça largou as rédeas dos dois cavalos, incerto sobre o que fazer.

— Desculpe, senhor! — Nick gritou, saltando para o banco do piloto e atiçando os cavalos. Quando pegaram velocidade, uma mão pousou em seu ombro, assustando-o.

— Bom trabalho — disse Allan. Nick sequer o vira entrar pelos fundos da carroça.

***

O que Robin Hood mais amava em seu Bando Alegre era que eles eram rápidos para se adaptar. Viu João Pequeno se esgueirar por trás das fileiras dos nobres. Na distância, um tipo diferente de gritaria, se aproximando. Era hora do show.

— Me ocorre agora que talvez os senhores precisem de um incentivo para me deixar partir com o garoto. — Desceu do telhado onde se encontrava, e isso foi como um sinal. De repente, João Pequeno havia puxado Marian de seu assento com uma força descomunal.

***

A chance de provar que confiava em Robin Hood e seu bando veio mais cedo do que Marian esperava. João Pequeno era um homem de uma gentileza incrível. Apesar do movimento brusco, mal sentiu um solavanco ao ser erguida.

— Desculpe por isso, Marian — ele disse, num sussurro imperceptível, ao sacar a adaga.

A lâmina sequer encostava nela, mas para a nobreza do pavilhão do Duque e os espectadores distantes, a cena parecia muito pior. Houve gritos. Até um desmaio de uma das damas presentes. Era um grande teatro, e ela sabia interpretar o seu papel. Assumiu uma expressão apavorada e ergueu uma mão até o braço com que João Pequeno a segurava, como se tivesse a intenção de tentar se libertar. Usou a oportunidade para fazer uma leve pressão, tentando comunicar que não estava com medo, que entendia o que estava acontecendo e, principalmente, que queria colaborar.

O barulho de tumulto se aproximava.

— João Pequeno!

Atendendo ao chamado de Robin, ele carregou Marian até onde Robin e Will aguardavam. Durante a movimentação, Marian finalmente conseguiu ver o rosto de João Pequeno, e foi pega de surpresa pelo bigode falso. Acabou soltando um gritinho, mas por sorte sua risada foi confundida com um grito de pavor.

Robin sorriu para ela.

— Se a senhorita quiser fazer as honras de vir conosco... — Deixou a frase no ar. A proximidade dele escondia o rosto da jovem da plateia. Os olhos de Marian brilhavam.

— Eu quero.

O sorriso de Robin se intensificou, e Marian voltou a ter esperanças.

O momento foi interrompido pela chegada do xerife e seus homens.

— Robin Hood!

A expressão do xerife era presunçosa. Os criminosos estavam cercados. Ele provavelmente acreditava que a captura de Robin Hood lhe renderia uma promoção, talvez até um título.

E então o tumulto que avançava pela rua os atingiu, um carroção descontrolado forçando as pessoas a saírem do caminho para não serem atropeladas. O motorista era um figura diminuta que tinha metade do rosto coberto por um chapéu grande demais para ele. O chapéu de Allan.

— Parece que nossa carona chegou! — o líder do bando anunciou. A carroça quase não diminuiu a velocidade.

Robin e Will pularam pra dentro. João Pequeno atirou Marian, e Robin a apanhou, os dois caindo no chão da carroça e rindo. Os homens do xerife dispararam algumas flechas, mas seus tiros tinham pouca força e menos precisão ainda. João Pequeno se pendurou na carroça, e Allan se debruçou para ajudá-lo a subir, enquanto Robin e Marian terminavam de se desvencilhar um do outro.

— Pra onde agora, Robin? — Allan perguntou.

— Para casa. — Os olhos do líder não se desviavam de Marian. — Nós conseguimos o que viemos buscar.

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