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Anotações No19 - Aprendendo a lidar com a frustração
Boas notícias para a minha vida que acabaram sendo más notícias para minha escrita.
Em novembro eu ia voltar a escrever
Então, meus planos de lançar um conto no fim de outubro e voltar a escrever em novembro caíram por terra.
Veja bem, foi por ótimos motivos: fui convocada no concurso público que prestei dois anos atrás. Vou ganhar melhor, ter vale alimentação, FINALMENTE começar a contribuir para a minha aposentadoria. Ainda assim, foi uma reviravolta total.
Eu me sinto tantada a contar a história toda em detalhes para efeitos dramáticos, acho que tem o potencial de ser hilário e emocionante, mas pra cada linha que eu escrevo de eventos parece que precisa de três linhas de contexto, e mesmo na newsletter eu tendo espaço, eu não tenho vontade de sair explicando minha vida desse jeito. Como parte do emprego novo passamos por um treinamento de segurança da informação, deixa eu me sentir uma pessoa discreta e precavida por uns dias, vai. Fora que no fim não são os eventos em si, e sim o que eles representam.
Eu passei o ano todo querendo escrever mais.
Estou financiando um apartamento pelo Minha Casa, Minha Vida, e além do pagamento de entrada tem uma parcela da Caixa Econômica Federal que vai aumentando conforme a obra avança. Lá pra abril essa parcela ficou alta o suficiente pra minhas contas do mês não fecharem, então voltei a dar aulas particulares, e desde então estou nessa jornada dupla de sair do escritório e ir dar reforço de matemática. Nessas condições eu não estava tendo energia apra escrever. Consegui continuar tocando a VAL porque é um esforço coletivo, mas todos os projetinhos estritamente pessoais ficaram irregulares, ou até abandonados completamente.
Apesar disso me encher de tristeza, consegui me consolar lembrando que era temporário. Em novembro terminavam os pagamentos da entrada, o que liberava verba, o que significava não pegar mais aulas particulares e voltar a ter TEMPO. Era difícil, mas eu só tinha que aguentar até novembro.
E então eu passei no concurso, mas o tempo que eu achei que estaria editando meu conto eu fui correr atrás de documento e exame admissional. O período para publicação e divulgação foi o de exames admissionais e ficar na incerteza se iam me mandar para a vaga do Rio de Janeiro. No último segundo conseguem me transferir de volta apra São Paulo, e daí era pras coisas acalmarem, né?
Só que não.
Minha colega de apartamento e eu já sabíamos que cada uma ia para o seu canto quando meu apartamento saísse, mas todo esse vai-não-vai com o Rio nos fez adiantar o processo. Ela vai para outro apartamento alugado, e eu vou ficar uns dois meses com os meus pais, até meu apartamento sair.
Era pra novembro chegar, e como "recompensa" pela minha disciplina, esforço e paciência durante o resto do ano eu deveria receber tranquilidade para voltar a escrever. Em vez disso, estou sendo "punida" com empacotamento de caixas, ter que contatar pintor, caminhão de mudança, etc. Pior: não basta a mudança, é saber que em uns dois meses vai ter outra. Então do meu ponto de vista novembro nunca chegou. Outubro acabou e eu fui arremessada pra fora do calendário pra algum espaço limial sem regras, porque isso que estou vivendo claramente não é novembro.
Em novembro eu ia voltar a escrever.
Nem tudo está perdido
Como eu falei, estou muito feliz em ter passado no concurso, e minha planilha de finanças JÁ está mais livre. Minha esperança é que eu consiga voltar a economizar nem que seja 50 reais por mês, para a cada X meses eu pagar uma capa, uma revisão, e manter meus contos saindo enquanto procuro uma casa editorial para o meu romance já escrito e recupero o foco para escrever o próximo.
Acho que vou deixar "A blogueirinha das calopsitas" para dezembro. Como será que as pessoas recebem um "lançamento de Natal" que não é natalino? Mas devido ao estado de perturbação mental que a mudança causa na minha vida, não vou nem tentar colocar uma data.
Além da perspectiva de investir na minha escrita, me permiti comprar um quadrinho que eu estava namorando já faz uns dois anos, e outro que eu tinha interesse, aproveitando os descontos da Festa do Livro da USP. Eu confesso que ainda tenho medo de "me permitir" coisas. É tanto tempo dizendo pra mim mesma "na volta a gente compra" que um dia que eu compro uma coisa supérflua mais carinha já começam os pensamentos acusadores: pronto, você pegou o Uber em vez de ir de ônibus, quando você ver vai estar gastando 600 reais de Uber; você comprou um doce, isso vai virar um hábito, vai gastar 200 reais com isso ao longo do mês e ainda engordar; um livro, nossa como é burguesa, como você ousa se dar tantos mimos e fazer tantas concessões? Eu tento lutar contra esses pensamentos pelo poder da planilha do Excel: eu conheço os meus gastos, e eu sei me controlar, e também sei quando tem flexibilidade para presentes e passeios.
Era pra eu postar uma foto dos livros, até pra ser uma quebra na leitura, mas a Ana Carolina de hoje não dá conta de subir fotos, desculpa.
Planos para o ano da serpente
Zodíaco chinês é um jeito mais divertido para se referir aos anos do que apenas "2025".
Acho que dois contos por ano é uma frequência de lançamento suficiente para eu produzir coisas, ter orçamento pra fazer essas coisas serem boas, e não pirar. Para 2025 quero lançar solo dois contos que participaram de outros projetos. Por um lado, não é tão divertido quanto ter um trabalho totalmente inédito. Por outro lado, permite focar em escrever coisas mais longas sem o medo de desaparecer do radar público por falta de lançamentos.
Uma coisa que quero fazer diferente é também lançar um dos contos em inglês. Não vou ficar fazendo marketing em inglês, não no começo, mas para esse eu planejo uma capa chamativa, e tenho meia dúzia de amigos fora do país pra quem eu com certeza enviarei o link. É um idioma a mais pra entrarem centavos pelo Kindle Unlimited, e é um bom prelúdio para quando eu voltar a escrever direto em inglês. Em parte porque eu não resisto ao apelo de ganhar em dólar, em parte porque a vida é tão irônica que às vezes é mais fácil ganhar fama lá fora e ser trazida para o Brasil do que ganhar fama no Brasil — já acontece com quadrinistas e desenvolvedores de jogos, por que não com livros? Mas isso é um plano para o futuro.
Planos de escrita, quero terminar o conto que eu enrolei 2024 inteiro para escrever — eu tinha escrito um beco sem saída para a trama e acho que consegui encontrar uma solução satisfatória, só falta testar ela colocando no papel. É um conto sobre sonhos, escrito de um jeito meio experimental, mirando na estética "Serial Experiments Lain" (inclusive, quero re-assistir para me inspirar).
Quero voltar a atacar meu romance sobre um necromante de uma cidade de necromantes que sai para se aventurar pelo mundo (que não aprecia necromancia). Essa é uma história onde as coisas que acontecem não são tão importantes assim, e o foco maior vai ser em diálogos intermináveis entre o Victor e seus companheiros de viagem, cada um tentando entender a visão do mundo do outro e conciliar as crenças com as experiências que eles tem ao viajar pelo mundo. Definitivamente não vai ser um livro para o mercado tradicional, mas eu quero muito colocar o Victor, o Simon, o Eleno e a Yella no mundo.
Esses são os planos mais ou menos sérios, mas no campo da especulação eu penso em um conto que escrevi sob um limite de palavras meio apertado e que ficaria melhor como uma novela. Eu cheguei a publicar ele no meu blog, mas a minha escrita evoluiu desde então e, como eu falei, a história iria se beneficar de uma expansão. Deixar os personagens respirarem, abrir espaço pra os leitores criarem teorias, esse tipo de coisa.
Planos não relacionados com o ato de escrever, mas ainda relacionados com a carreira de escrita, agora que eu descobri que um bate e volta para o Rio de Janeiro é possivel, faço questão de pegar um sábado de Bienal do Livro! Infelizmente, vai ser só 1 sábado mesmo, já que agora trabalho CLT e ainda vai um ano antes de eu poder pegar férias.
Planos não relacionados com nada, eu acho que vou tentar conhecer gente e fazer amigos presenciais. Tem um limite do quanto dá pra viver a sua vida on-line, e eu acho que já atingi ele.
Notas de Rodapé
Com essa correria toda eu me senti uma pessoa quebrada, e a leitura foi uma das coisas que mais me ajudou a segurar os pedaços no lugar até eles colarem de volta. Aqui estão os meus destaques:
Em outubro e novembro peguei para ler de verdade o livro de Star Wars que eu estava folheando desde fevereiro. Você já viu os memes sobre o diálgo entre o Palpatine e o Anakin na ópera? Foi assim que eu fiquei sabendo sobre o Darth Plagueis, e quando vi o livro na prateleira do sebo eu tive que comprar, 100% pelo meme. “Darth Plagueis” foi uma leitura muito gostosa, depois que eu reaprendi a ler livros físicos. Os Sith são divas dramáticas, é hilário, e especialmetne no começo do livro, quando tem menos humanos e mais alienígenas legais, é um universo de ficção científica legal de habitar. Toda a politicagem com senado, hutts, federação do comércio e etc. também é legal de acompanhar, mas às vezes a necessidade de conectar tudo de volta em A Ameaça Fantasma parecia uma algema prendendo a história. O veredito geral é que gostei, quero ler outros livros de Star Wars, especialmente outros do mesmo autor, porque a escrita dele foi uma delícia.
Um achadinho do Skeelo: "Ourika, uma senegalesa". É uma noveleta sobre uma menina negra criada na alta sociedade francesa porque alguém importante ficou com dó quando viu que ela — dois aninhos de idade e órfã — ia ser embarcada em um navio negreiro. Ela cresce com uma ótima educação e bastante amor em casa, mas em algum ponto cai a ficha de que ela é diferente das pessoas ao seu redor, e começa o tormento. Achei uma história incrível para refletir sobre "cultura", "pertencimento" e outros temas que tangem o racismo. Afinal, a Ourika foi educada pelo colonizador. Quando ela ouve sobre os massacres na Revolução Haitiana a reação dela é um eco do choque da sociedade francesa, não um grito de vitória. Ainda assim, ela nunca vai ser parte de verdade da sociedade onde ela cresceu.
Enquanto estou escrevendo essa edição eu ainda não terminei, mas “Apóstata”, da Fernanda Lírea, está sendo a minha leitura mais gostosa de novembro. Onde os outros dois livros que comecei se arrastam, Apóstata flui. E isso é mérito único e exclusivo da escrita da Fernanda, porque a editora é daquelas que quase não faz revisão, que dirá preparação de texto. Não é perfeito, dá pra sentir umas encrencadas em certos parágrafos, mas é gostoso. Apóstata é uma história sobre dois irmãos lobisomens destinados a cumprir uma profecia na lua azul, mas um deles não quer saber dessa vida. Gaspar foge para o Rio de Janeiro, onde acaba se envolvendo com Melchior... que é um vampiro. Mais do que um vampiro, Melchior é um "e se o Lestat vivesse um amor não-tóxico, que torna ele feliz?" and I think that's beautiful. (Hoje — domingo — o livro entrou numa MEGA PROMOÇÃO e se na segunda quando a newsletter chegar até vocês a promoção ainda estiver valendo, comprem. Estou falando sério sobre o quanto os personagens são apaixonáveis e a história é envolvente.)
Pra não falar que eu só leio coisas, numa tarde chuvosa estava apresentando minha mãe para Matilda: o musical, e depois do filme eu e meu pai sentamos para assistir "A incrível história de Henry Sugar", um filme com o Benedict Cumberbatch baseado em um conto do Roald Dahl (autor de Matilda). O filme é um curta-metragem, acho que uns 40 minutos, e é bem bizarrinho: é como se todas as cenas fossem gravadas em um palco, com os atores só fingindo que andam e o cenário sendo trocado atrás, e uma narração como se você estivesse ouvindo um áudio livro, não assistindo um filme. Eu achei adorável, combinou muito com o tom de realismo mágico da história, que é sobre um cara rico que aprende os segredos da yoga para trapacear nos jogos de cartas.
E por enquanto é isso. Em dezembro vou postar uma retrospectiva literária no Instagram — ou melhor, várias, porque tem os contos, as estatísticas, os livros em geral —, mas não acho que vai ter newsletter. Então o plano é nos vermos de novo em janeiro.
Obrigada por me lerem!
Um abraço,
Ana Carolina Dantas.
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